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sexta-feira, 3 de julho de 2020

POLIGLOTA DE ALMAS


    Ler é ouvir de si mesmo as palavras de todos os outros e tornar-se daí um poliglota de almas.
    Não ler é trocar todas as vozes do mundo pelos gemidos dos fantasmas da casa assombrada pelo próprio silêncio.
    Ler não é só decodificar os signos, tampouco um bom leitor o é pela quantidade ou pela diversidade de temas, gêneros ou idiomas a que se dedica.
    Ler de verdade é ser generoso com o universo alheio a ponto de partilhar do que é oferecido, mesmo completamente diferente, mesmo que choque, mesmo que leve a conflitos e impasses. Ler não é apenas “colher” do texto, mas sim trabalhar a terra, semeá-la, enfrentar o estio e as águas, matar as pragas, para, somente assim, compreender o que se colhe e, por conseguinte, o valor do alimento que os dois, autor e leitor, levaram à mesa.
    Dessa forma, um bom leitor não pode ser como um glutão, guiado apenas pelo prazer da mesa posta. Muito pelo contrário. Um bom leitor é aquele que senta à margem do rio sob o sol, enfia os dedos na terra imunda de vida e compreende assim, totalmente sensorial, o milagre na semente.

03/07/20

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