no quarto, os vãos
a mesa, vazia
os pratos, os copos, as mãos,
tudo vazio
a culpa vazia no fundo da garrafa
o esvaziamento das horas no preenchimento do dia
cada instante, repleto de mim,
mas fora de mim
eu, vazio, contemplo
o tempo e o espaço
aglomerados adiante
entre mim e eles, intermitências:
pausas, síncopes, soluços gástricos,
vazios que se escadarizam em degraus espaçados
— quase palanques —
donde se veem a casa, o quintal, o sertão e o mar,
os resquícios cada vez menores, mais distantes,
e o vazio crescendo entre si
só a chuva une todas as coisas
no vaivém das águas e dos vapores
— inunda e lava os espaços,
arrasta todos os preenchimentos,
concreto, animais e galhos,
em desconstruções que afagam a terra
e eis o vazio do novo,
o ator do preenchimento futuro,
a incongruente continência pronta,
a esperar mais vazios,
mais e mais vazios
copiando na mesa,
nos pratos, nos copos, nas mãos
e nas garrafas
a história do nosso tempo
11/04/22