ela
era dessas em quem
a vida e a beleza
haviam dado
algo de muito errado
ou belo
e a dor
que era nada elegante
mas sim esquiva
e tangente
lutava pra se sentir
de corpo presente
de que vale uma vida
vivida vívida na vala
em cima da qual se flutua
nua
num céu de navalhas?
por isso
por isso mesmo era
da rua
e do fundo das garrafas
zangue-se o tempo
dentro das noites sem treva!
ela
era mais uma
dessas
que a vida não leva
e a morte nem tenta
30/09/19

Este blogue se destina ao uso artístico da linguagem e a quaisquer comentários e reflexões sobre esta que é a maior necessidade humana: a comunicação. Sejam todos bem-vindos, participantes ou apenas curiosos (a curiosidade e a necessidade são os principais geradores da evolução). A casa está aberta.
sexta-feira, 30 de agosto de 2019
quarta-feira, 14 de agosto de 2019
PROCISSÃO

(Clique na foto para ampliá-la e aqui para acessar a página.)
Deixa, que o andor é só,
E a rotina da fé remonta a feras uivando
A luas inatingíveis.
Em cima, a Santa emburguesada
Transvê o óbvio dos mantos piedosos:
A litania enriquece os pobres
Nos fictícios bolsos d’alma,
Mas nus estão, e sem pele estão,
E seus ossos nervados e finos
Palitam os dentes de Deus.
Seja fome, seja qualquer outra ausência,
É preciso mantê-la como a natureza dos cães,
Sempre gregária, sempre coletiva, sempre identitária,
Sempre grata da dadivosa natureza de Deus.
A Santa, mulher, mãe virgem,
Virgem como as que se afunilam nos becos dos homens
Por promessas de carne e sal,
A Santa plange, punge, picota o coração
Das mãos encambadas nas cordas do andor,
Rasgadas em ripas de carnaúba,
Desunhadas de cimentos e flagelos
Que se acumulam nos ofertórios
E nos bolsos dos escultores de ex-votos.
Acima de todos, a Nave alçante de arribações,
Nas pontinhas das tamancas, apontando um Céu
Dos missais dos noviços
E dos brocados das casas-grandes:
O destino sempre intermediário,
Porém berço e túmulo de todas as empreitadas.
Nela, clímax e catarse fundem-se
Na maravilhosa e monotonal sentença
De que nada foi, nem é, nem será suficiente
Para a dignidade das almas.
E são todas almas indignas apesar de tudo,
E ninguém parte sem pagar o dízimo ao barqueiro
Atado à própria canoa de dois paus apenas
Pela tríade romana de pregos.
Assim, partem todos:
Crucificados, encruzados, persignados
E resignados
Pela glória e graça do teatro ruidoso
De ser autor, ator e plateia da própria tragédia,
Que nunca basta
E nunca acaba.
14/08/19
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