Prefiro a implausibilidade da vida
Que me leva de cá para Sabe-Se-Lá
À morte arquimédica, muda e polida
Da certeza de tudo o que se fará:
Uma fila hemofílica de horas contadas,
Em negras cadentes de um dominó
Cujo arranjo esbanja a linha traçada
Na górdia e trançada cegueira de um nó.
Monto na bala de um tiro no escuro;
Nado num ocaso de ocasião.
Tanja-me ao inalcançável dos muros
O gume hidrofóbico vindo do cão!
Prefiro que o olho nublado da morte
Por dentro me olhe em perscrutação
E eu escape por engenho ou por sorte
Na pergunta ou no corte que lhe pare a mão;
Prefiro isso tudo de que é feito o talvez
E que fez o acaso do não e do sim
Pintar-me na pele a insensatez
Com a tinta da alma empoçada em mim;
A ter de meu tempo a carne encarnada
Na carne de um corpo cujo coração,
Pêndulo lógico, máquina inchada,
Não passe de um pulso sem palpitação,
Sem sístole, diástole, sangue nas veias,
A temperatura excitada do amor,
Sem jamais ter jorrado na vida alheia
Nem susto, nem paz, nem espinho, nem flor.
Prefiro ser isto: a quase euforia,
A quase tristeza, a imprecisão;
À sensaboria de achar-me, um dia,
Perdido em viver no miolo de um não.
09/07/14
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