Número de sílabas (desde 11/2008)

counter

sábado, 21 de maio de 2011

AS INVASÕES BÁRBARAS

Curiosa, essa discussão que tem mexido os ânimos de professores, alunos e aspirantes a ambas as coisas, e que diz respeito à Língua Portuguesa.
Normalmente, quando se começa uma crônica, um artigo, faz-se isso com ímpeto, gana… vontade de colaborar com uma discussão sobre o objeto do texto. Neste caso, confesso que me dá uma preguiça… A mesma preguiça que se desenha diante da obtusidade das coisas e das pessoas-coisas. Vejo opiniões “apaixonadas”, oriundas de um buraco conteudístico profundíssimo. Nenhum conhecimento do que é uma realidade de sala de aula, em alguns; em outros, já cascudos, um “espírito-de-porquismo” (com hífen mesmo, que é para ficar ainda mais diacronicamente neológico). E todos (meu Deus!) apedrejando os “dinossauros hipócritas”, os “reacionários”, os “empatadores da liberdade”.
Confesso novamente meu cansaço. Todo dia, eu vejo minha cultura fragmentar-se; nossas perspectivas de ascensão de raciocínio minguarem; o individualismo vencer a coletividade… e o monólogo substituir o diálogo. Agora, vejo o pseudointelectualismo proveniente das academias, de suas camadas mais mentalmente indolentes, projetar-se como um guerreiro sumério, espada sangrenta em punho, dentes cerrados travando gritos guturais, sobre livros em bibliotecas, sobre a memória, sobre a ciência…
Que conhecimento do que é Língua Portuguesa têm esses senhores? Posso muito bem dizer qual seja: todos, sem exceção, maldizem seu próprio objeto de estudo. Não por ódio. Por vingança, por recalque, como a raposa que se propõe a desenraizar quantas videiras possa. Será que não há limites para a burrice e a vaidade? É preciso destruir o belo por não compreendê-lo? Ou por ser ignorante quanto a ele? Será que não se enxerga a ineficácia disso?
O que estão fazendo com a Língua Portuguesa é o que a raposa faria com as videiras se tivesse um machado. Quanta burrice, meu Deus, quanta vaidade!!! Cresçam, infelizes, saiam dos casulos coloridos e das nuvens etéreas da maconha universitária e entrem em salas de aula com mais de 60 garotos sem perspectiva, desorientados, para entenderem qual é o real propósito da educação! Não é adoçando a merda que ela vai deixar de ser merda e de feder! O Brasil é o TERCEIRO país do mundo com maior dificuldade em ocupar cargos que exijam cientificidade, operacionalidade, INTELIGÊNCIA!!!! E agora, vêm falar em preconceito linguístico, em constrangimento, em desestratificação social mediante uma prestação histórica de contas consistente em, finalmente, aceitar a valorização do uso de uma variação linguística menos favorecida? Imagina-se, por acaso, que, vestindo-se bem uma criança com fome, enche-se-lhe o bucho?
NÓS, professores, NÓS somos os responsáveis por despertar naqueles garotos a percepção múltipla da realidade, da adequação, da possibilidade do aprimoramento. NÓS somos os que podem, por meio da CAPACITAÇÃO, dar-lhes ferramentas para, verdadeiramente, saírem de uma situação de exclusão social.
Será possível que nunca tenha fim esse afrescalhamento com que se vem tratando a educação no Brasil? Querem maquilá-la até quando? Quando vão ficar contentes? Quando as universidades públicas perderem todos os seus ótimos professores para as privadas (com ambiguidade intencionalíssima), por estes não suportarem mais a defecação intelectual que estão tentando fazer com o Ensino Superior? E que não se tenha dúvida, pois é este o plano: ESTATÍSTICAS. Para os que não o sabem, nos âmbitos do Fundamental e do Médio, já está sendo feito há muito tempo. Não se pode mais reprovar um aluno que não tem condições de passar de ano. Ora, vejam só: MAS QUEM O PROFESSOR PENSA QUE É PARA AFERIR O NÍVEL DE INTELIGÊNCIA DO ESTUDANTE?

Deve haver alguém, algum teórico, tentando encaixar essa tática de aceitação da “informalidade” em outras ciências. História e Matemática, por exemplo:
— Õdi eh q tá u herru na minha resposta???
— Você disse que o Brasil foi invadido pelos ingleses em 13 de maio de 1500, liderados pelo capitão Barbossa e pelo Jack Sparrow.
— Poha, feçora, e pra q merda eu tenho q çabê deças koiza? E as minhidea, num conta?
— É verdade. Tome seu 10.

— I umaizum eh doiz?
— Claro que é.
— + eu soh herrei porum!
— E daí?
— + c ñ tah veno q eu fiz a poha da prova çem meu çelular? Inda keria q assertaci?

Indignação diante das últimas condutas do Ministério da Educação (cadê?) e Cultura (onde?) é pouco. O sentimento que se cria ainda não tem nome, e (eu sei) está fadado ao minguamento, pois, para cada professor e pedagogo indignados, há uma caterva de “defensores do massacre social, emocional e psicológico” que o ensino da língua padrão causa nos alunos. No fundo, o desejo deles talvez se baseie num “flower power” tardio e mal-interpretado, ou seja, talvez queiram um retorno à ignorância feliz e original que só o idioleto e a idiossincrasia absolutos de um bebê possam dar: um estado magnânimo de existência, em que não se tenha nem se precise de nada, exceto que um grande organismo gestor lhe proveja sangue e líquido amniótico em que se misturem fezes e urina, que, de tão doces, serão imperceptíveis.

21/05/11

Um comentário:

Eliézer Araújo disse...

Putz, eu vi pela primeira vez isso na minha aula de sociolinguística, achei um absurdo, não pude deixar de me indignar, Fernando.

Eu que vim do ensino público sei bem que diabo se passa, previ o "Apartheid Linguístico" que isso vai provocar.

Até comentei no site da globo.com, naquele programa, que eu não sei se tu já viste, o "Entre Aspas", onde o Cristovão Tezza e outro escritor que eu não lembro discutiam o tal livro.

Vou fazer um gancho dessa tua crônica, aproveitando que vou falar também sobre isso - claro, sem esse teu humor, sarcasmo puro - mas hei de dar minha opinião.

Abraços!