Número de sílabas (desde 11/2008)

counter

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

ILUMINAÇÃO


Ilustração de Daniel Danger

A sermos loucos, sejamos antes iluminados.
Com não o sermos, finjamos irradiar loucura,
para que ela se vá
e refrate-se no gentio ocupado e vítreo,
para que, ao voltar pródiga, ilumine-nos enfim
com a mesma loucura de uma mãe por seu filho,
de uma raiz por sua terra,
de uma vida por seu fio.
A sermos loucos, sejamo-lo assim
como o são as coisas mais simples e estúpidas:
a gargalhada de uma velha,
o espatifar de uma garrafa,
o espraiar-se da espuma de uma onda.
Sejamos opacos e obtusos e frágeis, muito frágeis.
Os frágeis sempre perduram,
porque vive neles o segredo da inefabilidade da vida.
Deixemos o diamante ser-se e cortar vidros
— sejamos a esparsa terra onde tudo vive e tudo morre.
Morramos, inclusive.
Em nós, não haverá tal que não nos seja
quando estivermos findos e idos e livres.
Não haverá coisa em nós que não enlouqueça
da suprema liberdade de não haver mais alma que nos contenha o espírito.
A sermos loucos, sejamo-lo direito.
Cuidemos. Sejamos ciosos com as asas de nossos sonhos.
Deixemos o ar frio da noite enclausurar-nos no escuro
para que um dia raie vingativo e bom
espaldado em nossas cadeiras de cipó
onde nossas histórias nos balancem divertidas,
contando-nos quem nós fomos.
O que fomos, é preciso esquecermos
para que nos soe novo e outro e tão alheio que,
desesperados de rir,
arquejemos como crianças sujas: “somos nós!”

12/01/11

Nenhum comentário: