Ela abandona o galho
E diz adeus com sua queda,
Até que o chão a ampara
No meio do flandre dos carros.
Ele rompe com a carne,
Atravessando o aço divisório
Do vermelho do mar de sangue
E da terra branca prometida.
Ela deixa a mente sair
E, no corpo, a modorra entrar
Em cápsulas desimaginadas
Que a dissolvem para outro lugar.
Ele, cansado de nunca o tempo
Passá-lo de cá pra lá,
Artificia-se em pêndulo
Para que possa ir-se com o tempo dançar.
Ela não quis o pouco que havia
E mais pôs, rápida, a invadir
O que, pelo ouvido, entrasse
E, por onde saísse, levasse-a.
Ele deitou-se espraiado
Debaixo de um céu de brigadeiro
E deixou-se cobrir, confortável,
Por um mar que o adormecesse.
Ela achou-se incontida
Na pressa do dia-a-dia.
Tentou desengarrafar-se
Por um sinal verde que a parasse.
Ele cansou-se de andar: parou.
Sentiu o vento mover-se para fora
De seu peito que o substituiu
Por um gás que mais o ascendesse.
Ela, farta do frio de estar
Exposta à geleira dos outros,
Inflamou-se por completo
Em busca do seu próprio calor.
Ele não gostava do próprio conjunto
De desarmônicas partes: desfê-las
De um golpe, libertando-as para sempre,
Sob e sobre os ferros imperfeitamente paralelos.
Ela conjurou os astros
E persignou-se ao peito manso,
Depois deitou-se com Deus,
Castamente jejuada.
Ele arrastou para fora
O que no ventre lhe tolhia
E parecia encher-lhe,
Esvaziando-se até sumir-se.
Eles demoraram mais. Aguardaram
Pacientemente o trem que, depois de uma vida,
Chegou pontualmente atrasado
Ao que já era o fim da linha.
22/08/09

Este blogue se destina ao uso artístico da linguagem e a quaisquer comentários e reflexões sobre esta que é a maior necessidade humana: a comunicação. Sejam todos bem-vindos, participantes ou apenas curiosos (a curiosidade e a necessidade são os principais geradores da evolução). A casa está aberta.
sábado, 22 de agosto de 2009
terça-feira, 18 de agosto de 2009
MONTAGEM
As palavras são nada.
Elas se enamoram, apaixonam-se, copulam, gestam e parem infinitas palavrinhas que, por sua vez, vivem ou morrem, e, se vivem, repetem a sina da família.
No entanto, a sua alma, o seu espírito, este jaz prestes no limbo das ideias, onde mais ainda se enamoram, apaixonam-se, copulam e parem, à espera de que unamos carne e espírito e as dinamizemos e, finalmente, projetemo-las prontas e cheias ao mundo.
Mundo este que também é um vazio preenchido de sentido pelas palavras que o descrevem.
Mundo: que é mundo, senão uma palavra infestada de palavras infestadas de sentidos que lhes damos?
08/2009
Elas se enamoram, apaixonam-se, copulam, gestam e parem infinitas palavrinhas que, por sua vez, vivem ou morrem, e, se vivem, repetem a sina da família.
No entanto, a sua alma, o seu espírito, este jaz prestes no limbo das ideias, onde mais ainda se enamoram, apaixonam-se, copulam e parem, à espera de que unamos carne e espírito e as dinamizemos e, finalmente, projetemo-las prontas e cheias ao mundo.
Mundo este que também é um vazio preenchido de sentido pelas palavras que o descrevem.
Mundo: que é mundo, senão uma palavra infestada de palavras infestadas de sentidos que lhes damos?
08/2009
domingo, 9 de agosto de 2009
DÊIXIS PRA CÁ
Deitar-te-ei num campo semântico
E, repleto de onomatopeias e silepses,
Com meu pronome pessoal reto e explicitado,
Introduzirei meu radical latino no teu circunfixo.
Porque tu és minha vogal tônica toda aberta,
Por ti, meu ditongo é sempre crescente,
Tua concordância morfossintática é quase um palíndromo perfeito,
E, sem ti, o mundo é um enunciado pleonástico.
Deixa eu ser a tua epêntese, deixa…
Abre o teu verbo para eu fazer uma mesóclise.
Minha onomástica gira em torno dos teus semas.
O meu estema se mete na sintaxe
Que, sob uma árvore diagrâmica, quero contigo reger.
Junta o teu verbo ao meu e façamos uma locução
Que, hiperbólica, exigirá um craseamento.
Ah, como o teu verbo copulativo deixa o meu pronome reto…
A abundância de teus verbos enche o meu dativo de interesse.
Por ti, minha sinédoque, serei sempre a forma rizotônica inflexionável.
Complementarei o teu nome com a preposição entre,
Articularei minha prosódia em teu pavilhão externo
E meus fonemas africados no fundo de tua glote.
Com métrica em picos ritmados de meu verso sátiro,
Terás oxímoros polissindéticos de tabuísmos repetidos,
Esbaldar-te-ás polissêmica e nada eufêmica
E engasgarás de revirar os pronomes oblíquos de tantas derivações regressivas que faremos.
20/07/08
Assinar:
Postagens (Atom)