Eu não conheço estações.Nunca vi o mar grego nem um campo de trigo ao pôr-do-sol.Nunca ouvi uma chuva de primaveraNem vi uma árvore desnudar-se em seu outono.Não sei o que são farfalhares de asas em tristes salgueiros.Nunca senti o frio de um córrego límpido e triste entre as encostas escarpadas da solidão de penhascos nas cordilheiras.Não sei o que é a solidão do marNem a vastidão do marNem os quebrantos de olhar de longe o porto seguro de uma pátriaNem a angústia da iminência de se encarcerar em uma prisão.Não sei.Não conheço as maravilhas que servem de cavalos para os sentidos que lhes galopam em pêlo.Só conheço essa vida,Só tenho essas mãos.Sei de pessoas comuns e de seus sentimentos comuns.Só sei dessa vida que contempla maravilhada os prodígios mágicos da criação,Para voltar, depois, regozijada e prenhe,Para o eito maquinal e alheio de seus ofícios de desentreter.
A mulher que costura panosPoderia dizer que é verdadeiramente simplesA mulher que os teceu,Mas uma máquina incapturável os urdiu.O homem que opera a máquinaPoderia elevar seu canto ao que, em uma forja negra, malhou o seu metal,Mas foi de uma outra o processo da serial manufatura.Mas aquele que opera botões e empurra alavancasDiria que um homem de mãos duras e gretadasArrancou da terra a pedra crua, gérmen do metal,Se não fora a bruta dinamite que sangrara a terra e enfeiara para sempre a face verde da montanha.
Só tenho essas mãosE só posso cantar os catadores de lixo,Os malabaristas de sinal e os coletores de papel.Eu os canto sem paixão e sem crítica,Em seu constante cruzar encruzilhadas,Como se não os visse, como se não fosse visto.
16/01/08

Este blogue se destina ao uso artístico da linguagem e a quaisquer comentários e reflexões sobre esta que é a maior necessidade humana: a comunicação. Sejam todos bem-vindos, participantes ou apenas curiosos (a curiosidade e a necessidade são os principais geradores da evolução). A casa está aberta.
quinta-feira, 6 de novembro de 2008
O SILÊNCIO ENTRE AS PALAVRAS
Somos o silêncio entre as palavras
Quando falamos, quando nos descrevemos,
Quando nos decompomos no que julgamos ter cor e cheiro e gosto.
Somos as palavras que calamos.
Quando dizemos nuvem, a nuvem dentro de nós
Chove, desaba em torrentes, sombreia, navega…
Mas a nuvem dentro de nós não chove nem faz sombra
Porque ela é o que somos
E não sai ao mundo na palavra sombra nem na palavra chuva.
Eu sou o meu silêncio, o meu silêncio de mar, de nuvem, de pedra.
Eu sou o aço que dorme na pedra do meu silêncio.
Quando digo adeus, eu não sou o adeus,
Eu sou todas as palavras silenciosas, inexprimíveis,
As palavras ígneas do inferno do meu adeus.
19/04/08
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