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segunda-feira, 8 de julho de 2013

VIGÍLIAS


Tantas vigílias…
Quando tudo acabar, digam-lhe que estive aquele tempo inteiro
em vigílias.
Vigiei seu sono, vigiei minha insônia.
Fiz de tudo àquelas horas:
uma colcha de retalhos;
uma casa na praia;
uma rua deserta;
uma saúde de ferro.
Não preguei nem parei os olhos,
que se evolaram das cavidades cranianas em fumos de idolatria
— há sobre uma pedra um ebó para cada noite
e um mar cheio de espelhos, perfumes baratos e pentes de feira —,
mas nada, nada suspeitava que seria eu
o ermo daquele tempo, o cume daquele pico, o fundo daquele mar.
Tudo e tanto que esperei,
e era de mim que caçoavam as horas presas
no fundo das garrafas nunca entornadas.
Ali, à espera, à espreita, à porta,
rompia os azulejos baratos do chão
— chão falso, chão de mentira de casa-de-sobrado —
a árvore anã da epifania:
não havia o que esperar.
Quebram-se ossos, imolam-se órgãos em tachos de ferro,
salta-se para o esmagamento lento
nas avenidas repletas de dezoito horas,
e, por fim, desespanta-se num desviver
de pedra de granito de boca-de-lobo.
Ali fiquei, estatuado.
Dali me observo, pétreo, imane ao que virá,
feito pedra que já foi espelho
onde se escreveram, a batom e hálitos, arremedos de corações
e toda sorte de eu-te-amos.
Digam-lhe isto, digam-lhe que já fui vigílias.
E que guardo em mim, como vermes, todas aquelas horas ocas,
tão caninamente esganiçadas por ossos, restos, migalhas,
que hoje me devoram.
E que o que elas comem tem nome
e se chama amor.

08/07/13

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