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domingo, 15 de abril de 2012

AUTOFAGIA


Eu solto meus pensamentos como a uma matilha, uma alcateia, uma malta
no meio da noite desabrida.

Eles rasgam o negrume com suas presas e suas garras,
caninos e unhas feitos da têmpera e do aço do desejo e do horror,
do ódio e da loucura das horas enclausuradas
aqui, nas jaulas de seus próprios ossos.

Meus pensamentos saem à caça de carne
vívidarubraflamejantepungente,
mas não se importam de refestelar-se na podridão abandonada
de uma ideia morta e seca no agreste do mundo,

porque a fera que jaz silente no oco desse mundo
deles também se alimenta, neles também se esbalda
e os abandona dentro de mim, perdidos, mutilados, agônicos,
cheios de incompreensão e retroalimentado ódio.

Meus pensamentos também são carne e presa
de tudo aquilo que os corrói
— o homem —,
e vingança é o nome por que atendem.

Às vezes, retornam de mãos vazias,
famintos e cegos, inermes.
São meus.
Estendo-lhes um braço, uma perna,
um naco de minha alma de pai
e deixo que me despedacem friamente,
espoliando-me e consumindo-me o sono, os sonhos
e todas as dores desse mundo que me correm vermelhas sangue adentro.

15/04/12

Um comentário:

Eliézer Araújo disse...

Fernando, eu pude sentir este poema.