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sexta-feira, 9 de maio de 2014

O REGRESSO A ÍTACA


Entrei.
Dei um bom-dia cor de adeus,
abri a carta e li,
diante dos centímanos,
meu Prometeu sem anéis
do cabeçalho ao rodapé,
sem pausas nas vírgulas, sem tons sur tons,
e despachei minha antiga mala de infâncias e ensaios
para a boca aberta de dentes
que sempre me costumou engolir as odisseias.

— Vão!, minhas desgraças…

De página em página, esfreguei a borracha de cinzas
e queimei-as ao contrário,
desfazendo o gozo de fênix em folhas brancas, imaculadas,
inéditas como virgens,
patéticas como virgens,
tristes como virgens.
Morro ao contrário toda vez,
toda vez, desfaço a fiadura da angústia
de construir-me para morrer
fio a fio, trama a trama,
página a página.
E não há Penélopes que me esperem
nas ilhas dos além-gentes
nem nada que me conte
nos portos de aquém de mim.
Junto as laudas raspadas num calhamaço de escolar,
amarro o nó da garganta firme,
espero a primeira vela e volto
— mas tudo já me parece tão novo…

05/05/14