Número de sílabas (desde 11/2008)

counter

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

A ALMA DOS GUERREIROS


Estava vendo aqui as modinhas do Facebook e me lembrei de um diálogo de um filme excelente chamado A Alma dos Guerreiros (Once Were Warriors), de 1994 ou 95 (não sei ao certo), dirigido por Lee Tamahori. O filme trata da rotina do povo maori residente nos subúrbios de Auckland, na Nova Zelândia, centralizada na vida de uma família conflituosa. Ao final, um dos filhos, ao ser inquirido sobre o porquê de não usar as tatuagens tribais com que seus amigos demonstram o seu orgulho étnico, responde:
— As minhas são por dentro.
Talvez seja a necessidade moderna de seguir tendências, talvez seja simplesmente uma deficiência de personalidade, talvez seja somente frivolidade… O fato é que as redes sociais fizeram as pessoas viciarem-se em si mesmas. O curioso é que, ao passo que urgem ser raríssimos e individuais como diamantes negros, agrupam-se em tribos de indivíduos igualmente diferentes (ou diferentemente iguais). Não há novidade nisso. O hedonismo “neohippie” (que fique clara a ironia desta adjetivação) destes anos 10, o questionamento presunçoso (visto que fundamentado não na coletividade, mas em si mesmo) dos padrões sociais, a ascensão de uma burguesia mais burra que as suas predecessoras, o egocentrismo, a infanto-adolescência estendida aos limites do que a mídia categoriza como “jovem”, enfim, essas mazelinhas sociais que flagelam essa nova classe média oriunda do conceito do “poder de compra” e da ideia de permanente (e, por que não dizer, obrigatória) felicidade dele advinda trouxeram consigo essas novas autodefinições.
— Eu sou contra os maus-tratos aos animais, logo porei dezenas de postagens com mutilações, seus mutiladores e seus mutilados para que todos saibam como eu sou “antenado” com as injustiças cometidas àquelas pobres almas.
— Eu sou contra a construção da usina de Belo Monte, logo postarei aqui fotos de crianças indígenas para expressar a minha indignação e o meu desejo de justiça.
— Eu sou contra a violência infantil, logo (genial, genial!) mudarei minha foto do perfil do Facebook para a imagem do meu personagem preferido de HQ/cartum/mangá/desenho animado/longa-metragem de animação/etc. para que todos percebam como eu me importo.
Algum problema com as três causas citadas acima? Na minha opinião, com as causas, nenhum. Todavia, é bom ponderarmos sobre que buraco de personalidade é esse que se tem hoje, que se preenche com causas como se fossem modas; com inquietações legítimas como se fossem comunidades orkutianas (indicadores máximos de personalidade na década passada); com almas alheias como se fossem as suas. Caio Fernando Abreu virou o tradutor virtual oficial da liberdade irresponsável que se apregoa hoje aos quatro ventos: a bandeira do “eu mereço ser feliz” (mais uma vez, frise-se aqui a minha ironia).
Qual é, meu povo? Qual é?
Estas últimas décadas parecem mais órfãs que eu e os de minha geração. Perdemos pais, ídolos, referências, mas mantivemos ideais enraizados firmemente. A quem recorrem esses de hoje? Ao Google?
Vou dar um jeito de rever esse filme que mencionei no início… “As minhas são por dentro” é algo que, hoje, faz mais sentido a mim do que nunca.

04/10/11

3 comentários:

JOKER disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
JOKER disse...

Caramba Fernando de Souza, parabéns pelo ótimo texto. Um tapa na cara de muita gente. Mas o mais impressionante nesse teu texto é que me fez lembrar de muita coisa, como por exemplo a tatuagem da tribo maori. Um ano atrás mais ou menos eu tava lendo sobre a tribo e achei bem interessante, deu vontade de fazer uma tatto de um tribal maori, mas fiquei pensando... Será que essa minha vontade é porque eu realmente gostei do ideal que aquilo iria representar pra mim ou será que apenas um modismo que estou pensando em seguir? Modismo, já que de um período pra cá quase todas as pessoas que vejo tem uma tatto. Cheguei a conclusão: Muitas dessas pessoas que parecem antenadas com o que acontece ao seu redor, na verdade só estão indo junto com a maré, estão sendo carregadas sem saber pra onde vão ou porque vão. E sobre a questão dos animes e desenhos em forma de "protesto", inicialmente eu achei legal a ideia e até coloquei como está vendo na minha foto. Mas o que estou vendo é que as pessoas estão tendo um momento nostálgico relembrando da infância e o motivo inicial que era sobre a questão da exploração infantil onde ficou? Estou vendo muitas causas sendo banalizadas e parece que a juventude não tem a coragem e voracidade de ir a luta pelos direitos, de protestarem. Essa semana, fiquei triste porque um colega que foi aluno do XII de MAIO disse que professore se quiser ganhar melhor tem que fazer por merecer e criticou a todo momento os últimos ocorridos na greve dos professores, mas o engraçado é que ele não foi nenhuma vez aos protestos, não estava por dentro da causa. Quer dizer, parece que os protestos se restringiram às redes sociais. Não tenho nada contra os protestos que são feitos aqui na internet, mas que isso saia daqui e vá pro seio da sociedade.

Crisneive Silveira disse...

Puta que pariu! (Precisa de mais?)