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quarta-feira, 6 de julho de 2011

DAGUERREÓTIPOS


E as fotos, assim como os rostos, eram todas as mesmas. Todos sorriam cheios de nada, desse nada que preenche espaços visuais.
Atrás da câmera, uma registradora de toda aquela vanidade, alguém que a procurava, certo de que lá estaria quando se percebesse olhada. Como se enganava! Sempre se percebera olhada, mesmo não o sendo. Sempre se tivera de mostrar, sempre sentira a obrigação de ser vista, percebida, registrada indelevelmente. Adorada. Ela era um sorriso lindo, uns olhos faceiros, um conjunto desarmônico de sardas e covinhas — tudo que achava conjuração de desejo por quem quer que a tivesse. Já ele dera o azar de ter olhos que desejavam vida nas cores e razão nas linhas, nas curvas, nas formas. Ela era anúncio de revista, e só. Ele queria, coitado, uma ilustração de livro — ainda que fosse de uma língua que balbuciasse, que, tartamuda, hesitasse o enredo, ocultasse a personagem…
Fadaram-se ambos aos dois lados da câmera que nunca os retrataria como eram.

06/07/11

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