Número de sílabas (desde 11/2008)

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sábado, 22 de agosto de 2009

TRANSPOSIÇÕES

Ela abandona o galho
E diz adeus com sua queda,
Até que o chão a ampara
No meio do flandre dos carros.

Ele rompe com a carne,
Atravessando o aço divisório
Do vermelho do mar de sangue
E da terra branca prometida.

Ela deixa a mente sair
E, no corpo, a modorra entrar
Em cápsulas desimaginadas
Que a dissolvem para outro lugar.

Ele, cansado de nunca o tempo
Passá-lo de cá pra lá,
Artificia-se em pêndulo
Para que possa ir-se com o tempo dançar.

Ela não quis o pouco que havia
E mais pôs, rápida, a invadir
O que, pelo ouvido, entrasse
E, por onde saísse, levasse-a.

Ele deitou-se espraiado
Debaixo de um céu de brigadeiro
E deixou-se cobrir, confortável,
Por um mar que o adormecesse.

Ela achou-se incontida
Na pressa do dia-a-dia.
Tentou desengarrafar-se
Por um sinal verde que a parasse.

Ele cansou-se de andar: parou.
Sentiu o vento mover-se para fora
De seu peito que o substituiu
Por um gás que mais o ascendesse.

Ela, farta do frio de estar
Exposta à geleira dos outros,
Inflamou-se por completo
Em busca do seu próprio calor.

Ele não gostava do próprio conjunto
De desarmônicas partes: desfê-las
De um golpe, libertando-as para sempre,
Sob e sobre os ferros imperfeitamente paralelos.

Ela conjurou os astros
E persignou-se ao peito manso,
Depois deitou-se com Deus,
Castamente jejuada.

Ele arrastou para fora
O que no ventre lhe tolhia
E parecia encher-lhe,
Esvaziando-se até sumir-se.

Eles demoraram mais. Aguardaram
Pacientemente o trem que, depois de uma vida,
Chegou pontualmente atrasado
Ao que já era o fim da linha.

22/08/09

terça-feira, 18 de agosto de 2009

MONTAGEM

As palavras são nada.
Elas se enamoram, apaixonam-se, copulam, gestam e parem infinitas palavrinhas que, por sua vez, vivem ou morrem, e, se vivem, repetem a sina da família.
No entanto, a sua alma, o seu espírito, este jaz prestes no limbo das ideias, onde mais ainda se enamoram, apaixonam-se, copulam e parem, à espera de que unamos carne e espírito e as dinamizemos e, finalmente, projetemo-las prontas e cheias ao mundo.
Mundo este que também é um vazio preenchido de sentido pelas palavras que o descrevem.
Mundo: que é mundo, senão uma palavra infestada de palavras infestadas de sentidos que lhes damos?

08/2009

domingo, 9 de agosto de 2009

DÊIXIS PRA CÁ


Deitar-te-ei num campo semântico
E, repleto de onomatopeias e silepses,
Com meu pronome pessoal reto e explicitado,
Introduzirei meu radical latino no teu circunfixo.

Porque tu és minha vogal tônica toda aberta,
Por ti, meu ditongo é sempre crescente,
Tua concordância morfossintática é quase um palíndromo perfeito,
E, sem ti, o mundo é um enunciado pleonástico.

Deixa eu ser a tua epêntese, deixa…
Abre o teu verbo para eu fazer uma mesóclise.
Minha onomástica gira em torno dos teus semas.
O meu estema se mete na sintaxe
Que, sob uma árvore diagrâmica, quero contigo reger.

Junta o teu verbo ao meu e façamos uma locução
Que, hiperbólica, exigirá um craseamento.
Ah, como o teu verbo copulativo deixa o meu pronome reto…
A abundância de teus verbos enche o meu dativo de interesse.

Por ti, minha sinédoque, serei sempre a forma rizotônica inflexionável.
Complementarei o teu nome com a preposição entre,
Articularei minha prosódia em teu pavilhão externo
E meus fonemas africados no fundo de tua glote.

Com métrica em picos ritmados de meu verso sátiro,
Terás oxímoros polissindéticos de tabuísmos repetidos,
Esbaldar-te-ás polissêmica e nada eufêmica
E engasgarás de revirar os pronomes oblíquos de tantas derivações regressivas que faremos.

20/07/08